B.F. Skinner, famoso psicólogo comportamental,
escreveu o romance – se assim dá para o chamar – Walden II, Uma Sociedade do Futuro, creio que motivado pelo célebre
livro de Thoreau, onde descreve então a criação de uma comunidade alternativa
ao modelo de desenvolvimento em voga. A partir da “engenharia do comportamento”,
a comunidade se estrutura com novos formatos de ensino, trabalho e modos de
vida. Difícil alguém ler e não se motivar com uma sociedade utópica como a
qual. A ideia básica é que uma sociedade pode ser melhor conduzida a partir da
ciência do comportamento, ou seja, ao se entender a psicologia humana e a
partir disso desenvolver todo o modelo de desenvolvimento e envolvimento social
para se atingir um estado de bem-estar único e jamais atingível dentro do nosso
atual modelo de vida.
Eu poderia escrever muito mais sobre esse
livro, mas nesse momento me atenho a uma passagem que, para mim, é central:
“(...) nós estimulamos nossa gente a
olhar cada hábito e costume tendo em vista um possível aperfeiçoamento. Uma
atitude constantemente experimental com relação a tudo – é isso que precisamos.
Soluções para problemas de todo o tipo se seguem quase que milagrosamente”.
Percebem a profundidade dessa ideia? Ela
quer dizer que, para acharmos as soluções para os problemas, primeiro temos que
analisar todo o nosso comportamento, nisso nossos hábitos, nossa própria
cultura (e daí eu sugeriria, se te interessares sobre esse pensamento, que
estude a ideia de cultura para entenderes que cultura não é necessariamente
algo bom!). Repensar nossas atitudes que se expressam a
partir de comportamentos embutidos numa cultura geralmente invisível. Por que
temos que nos vestir assim? Por que tenho que parecer sexy? Por que posto
tantas fotos no Facebook/Instagram? Por que penso tão pouco acerca do todo, do mundo, do bem-estar das outras pessoas e tanto sobre o que eu quero ou não quero? Por que tenho que ter
isso, agir assim, pensar dessa forma etc.? Por que comprar isso?
De onde vem esse produto que estou a consumir?
Sem um olhar crítico sobre tudo o que se
faz (e esse fazer está estruturado dentro de um rol limitado de ações
culturais), nós continuaremos sempre na mesma situação. Percebam que as
mudanças sociais/culturais ocorrem sempre quando alguém pensa em algo diferente.
Alguém, outra pessoa, não tu que estás preso, cego dentro de um sistema onde todos os outros estão e isso faz com que seja “normal” agir e pensar igual a todos. Aí, tem
sempre alguém fora da caixinha, buscando novas formas de pensar, agir e fazer.
São essas pessoas que levam a humanidade para a frente, enquanto que os demais
(e tu!) ficam no lastro dessas mentes.
Soa, assim, que é preciso ser alguém muito
especial para causar tais mudanças. Errado. Apenas é necessário desenvolver um
senso crítico para analisar o que nos acontece, o que ocorre dentro das nossas
cabeças. Uns aprendem meditação e isso é uma forte ferramenta. Outros conseguem
desenvolver um senso natural de observação da mente, das ações e começa, assim,
a surgir naturalmente questões de “Por que isso é assim?”. Um senso crítico assim permite que essas pessoas não comprem ideias que chegam a elas via Whatsapp, Facebook ou mesmo por textos aparentemente bem escritos. Questionariam inclusive esse texto com questões razoáveis e não tendenciosas, marcadas por uma tendência de defender o seu modo de vida, aquilo que acreditam apesar de todas as evidências contrárias.
Nisso, tu entenderás o conceito de “conservador”
e “progressista”, embora a diferença, no fim das contas, pode ser sutil. O
conservador é aquele que se deu bem dentro de um modo de vida e quer mantê-lo
de todas as formas. Nossa política é praticamente toda conservadora, mesmo
entre aqueles que se chamam de progressistas (por isso a sutileza na diferença
quando se trata de políticos). O Brasil é uma país extremamente conservador
nesse sentido e isso se observa, p.ex., quando se vê a disputa entre o
agronegócio e o meio ambiente (falo disso por ser minha área de estudo). De tão
conservador, o agronegócio, mesmo quando tecnifica suas atividades, ainda assim
permanece conservador na ideologia por trás de como percebe o mundo ao redor.
Isso cria um conflito desnecessário, dando força à forças retrógradas do
desenvolvimento social e político e essa força elege uma pessoa tão atrasada
nisso e conservadora ao extremo como Bolsonaro. De tão conservadores (para manter
seu modo de vida inviolável a qualquer custo), combatem até a ciência que
aponta a real necessidade de se manter ecossistemas saudáveis para o próprio
agronegócio progredir (polinizadores, água, chuva, temperatura, controle de
pragas etc.). Não vou me prolongar nesse parágrafo, já que não é esse tema o
propósito desse texto. No entanto, a chave para os problemas está nesse tipo de
comportamento.
Não pensar nossos comportamentos e atitudes
leva, como diz Skinner, a não encontrar a solução para os problemas que
enfrentamos e nisso ficamos dando voltas e voltas sempre nas mesmas questões. Quem
ler Etienne de la Boétie, A Servidão Voluntária, vai perceber que os problemas
descritos por ele na França de 1500 são os mesmos que ainda enfrentamos hoje no
mundo. Sem mudanças de cabeça, como diz Daniel Quinn em A História de B, ou
mesmo Einstein (numa frase atribuída a ele), não sairemos dessa roda. A solução
de um problema não pode ser encontrada pela mesma cabeça que o criou, disse
supostamente Einstein. Essa mudança de cabeça só é possível com a mudança de
comportamentos/atitudes e essa só ocorrerá através do aperfeiçoamento dos
nossos hábitos, como supõe Skinner.
Será que a gente consegue? É uma batalha
individual, não adianta. No entanto, comportamentos mudam também ao se observar
a mudança do outro e isso tem um potencial ainda maior para a mudança
individual: estimular a mudança em cadeia. Assim, que tu sejas uma semente de
mudança ao começar a parar por um instante todo dia, sentar, respirar
profundamente umas três vezes, ouvir o som ao redor, acalmar a mente e então
começar a perceber os pensamentos que te surgem e te empurram para certos
comportamentos e, tomando consciência deles, perguntar-se: “De onde veio esse
pensamento? Por que ele surgiu? Por que eu quero fazer isso, afinal? O que
quero atingir agindo assim?”
Perguntas simples, mas difíceis de serem
feitas pela necessidade desse momento de calmaria e percepção de nós mesmos ao
invés do que queremos que os outros pensem sobre nós. Mudanças, mudanças que
queremos, a sociedade que buscamos viver e contribuir para. Mudanças possíveis
unicamente com a nossa mudança (lembram daquela frase clássica que é preciso
arrumar o nosso quarto antes de tentar mudar o mundo?). Comece hoje, comece
agora. Por que não? Se chegastes até aqui na leitura, tens o potencial para
tanto ao ter a paciência para ler um texto com mais de 4 linhas e sem um meme! Comece, sente, respire, olhe ao
redor e comece a observar a tua mente...apenas a tua.