sexta-feira, 5 de agosto de 2022

Sobre o pensar e o conhecer

Pensar e conhecer, segundo Hannah Arendt, são coisas diferentes. Eu posso pensar sobre política, sobre a Amazônia, sobre o mundo e sobre qualquer coisa sem mesmo conhecer ou ter botado os pés no lugar. O conhecimento, esse associado com a cognição e o intelecto, é algo mais profundo e exige a experiência sobre o objeto, sobre o fenômeno.

Isso me fez pensar que entendi o porquê das pessoas acharem que conhecem simplesmente porque pensam - que dá um senso de razão - sobre alguma coisa que estão a debater, mas sem, no entanto, terem o menor conhecimento real daquilo, sem entenderem sobre a coisa. Se eu penso, existo, não? Mas pensar sobre sem ter todo o fundamento de algo é o que está levando a todo esse equívoco político no país. Por outro lado, as pessoas que conhecem, realmente, não são levadas a sério pelas pessoas que pensam saber - e que inclusive estão no poder - e, no lugar dessas que deveriam estar a pensar sobre o que conhecem, estão aquelas que pensam conhecer.

É muito fácil para você saber se pensa ou se conhece: você já estudou a fundo ou teve uma experiência real e profunda sobre aquilo que você está pensando saber para falar ou você está falando porque ouviu falar e, porque te agrada a ideia, faz sentido para aquilo que você pensa saber? Se nunca pegaste no mínimo cinco livros sobre o assunto, muito pouco provavelmente você sabe.

Como não se conhece algo somente e só por livros, a experiência de vida conta muito. Tem muitos liberais e socialistas que nunca vivenciaram nem um e nem outra realidade na própria carne para levantarem qualquer uma das bandeiras. Na ausência dessa, seja por temporalidade ou espacialidade, recorra aos livros, mas mais de um, no mínimo (o cinco acima é um número qualquer maior do que um e um número que no mínimo vai te dar uma boa amplitude sobre o tema com diferentes pontos de vista).

Não pense que você sabe. Primeiro, ouça aqueles que conhecem. Depois, estude e, quem sabe, poderás pensar que sabes, assim como eu.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2021

Tu és insano(a)? Não? Tens certeza?

O interessante da política é que nossos representantes repetem os mesmos atos repetidos por outros, repetidas vezes, esperando resultados diferentes (se é que esperam algo!). O nosso sistema econômico é desenhado, conscientemente ou não, para que ocorram crises cíclicas: sempre vai ocorrer estagnação econômica, crise, e jamais será possível acabar com o desemprego, seja lá o que quer que se faça. É impossível, basta ver que em qualquer país e com qualquer partido no governo, sempre tem desemprego em massa (há desemprego mesmo em países com pirâmide etária super invertida).

Não se olha para a causa disso: o próprio sistema! Vivemos numa sociedade insana, se for válida a máxima de que uma pessoa insana é aquela que faz a mesma coisa repetidamente e espera por resultados diferentes (frase atribuída a Einstein). E essa mesma coisa é insistir em um modelo econômico que é baseado em crescimento constante através do uso de matéria prima não renovável em um planeta finito, que sobrevive através do consumo (você e eu temos que comprar produtos constantemente para esse modelo econômico sobreviver e para isso os produtos tem de durar pouco), e que não tem capacidade para gerar emprego para todo mundo e jamais terá, principalmente com o constante crescimento populacional no mundo que ainda tenderá a crescer muito mais antes de entrar num padrão mundial de decrescimento (se e quando entrar!). E não será a Esquerda ou a Direita que conseguirão resolver isso, percebas, já que a mentalidade desses grupos varia ainda dentro do mesmo sistema. Não sai dele, não pensa fora da caixa, apenas conseguem vez ou outra minimizar, mas jamais resolver e logo se tem uma nova crise.

Um exemplo de tudo isso: lendo um trabalho sobre a Amazônia no Equador (ainda não publicado), fiquei pasmo ao saber que o governo decidiu que quer explorar todas as reservas de petróleo e minério para resolver o problema da crise econômica do país, onde 40% da mão-de-obra está desempregada. Não vai resolver, já que boa parte do capital não fica no país, outra se perde por corrupção e a que é usada não é feita de forma inteligente visando acabar com o problema, mas sim amenizar paliativamente para entrar em nova crise a seguir sem ter conseguido sair da primeira (ou seja, continua na mesma!). Não se ataca as causas básicas do problema, que estão na super concentração de terras, baixa industrialização, capital basicamente dependente de exportação de matéria prima (que novamente enriquece uma minoria e o dinheiro para o Estado é perdido pelos caminhos tortuosos da máquina pública).

É a cara do Brasil, percebam. As ideias são as mesmas com o atual presidente e não foram muito diferentes com os anteriores, já que caímos numa crise (e eu ainda acho que uma das razões foram gastos bilionários e corrupção com a copa e olimpíadas, perto de R$ 100 bi, que na época batia com o déficit orçamentário do governo Dilma).

Vão entrar e sair governos e não vamos resolver nossos problemas, esqueça! Poderemos dar mais um impulso para respirar, mas continuaremos sem saber nadar dentro de um oceano turbulento e caótico, esperando pela próxima onda a nos encobrir. Basta olhar para as principais economias do mundo para ver que não tem saída. O problema é que, como somos nós que elegemos os políticos que repetem as mesmas políticas, os insanos, no fundo, somos nós próprios. 

Então, eu te pergunto: tu votas com esperança de solução dos problemas sociais, ambientais e políticos? Sim? Então, de acordo com Eisntein, tu és insano(a). Consegues perceber? Não? Bom, os insanos não conseguem perceber a sua própria insanidade.

E como solucionar isso? Estou trabalhando em um texto, sem data para finalizar, sobre algumas utopias já propostas e o porquê delas serem utopias.




sexta-feira, 3 de abril de 2020

Todas as ciências contribuem para a humanidade?



Lendo um estudo interessante de uma amiga sobre a vulnerabilidade de áreas florestais em pastagens que facilmente pegam fogo, perguntei-me para quem se está publicando tantos estudos interessantes. Percebam que os únicos conhecimentos que ganham um fim útil para a humanidade são aqueles com aplicações nas áreas de saúde, tecnologia ou em áreas produtiva e que são apropriados pelas indústrias que visam lucro com aquele conhecimento. Aqueles de áreas que não tem um uso comercial ficam apenas para os acadêmicos discutirem e de forma limitada ganham o público e passam a ser vistos como não tendo utilidade para a sociedade. Muito provável seja essa a causa da visão equivocada e limitada do governo Bolsonaro decidir investir o dinheiro de pesquisa em áreas com esses mesmos fins e cortar fundos para as demais.
Isso quer dizer que todas as demais áreas do conhecimento humano (ciências da natureza, humanas e artes etc.) não contribuem em nada para a humanidade? Em verdade, não, e é bem possível que contribuiriam muito mais. O conhecimento produzido nessas áreas contém possibilidades de causar mudanças sociais enormes no que tange a qualidade de vida humana em um nível ainda mais básico e sútil do que as amenidades propiciadas pelas ciências da saúde e de engenharias, por exemplo. A sociologia e a psicologia, p.ex., possuem há muito respostas para ajudar melhorar as relações humanas tanto no nível das organizações sociais e políticas como no nível do indivíduo (i.e., saber lidar com suas emoções) para criar um Estado de bem-estar comum a todos (e isso não tem nada a ver com comunismo!). Se a filosofia fosse algo disseminado na sociedade (e não aquelas banais aulas do colégio que fazem dormir), certamente teríamos indivíduos capazes de pensar por si e que não cairiam tão fácil em “contos da Carochinha” em tempos de campanha política. A ecologia deveria ser a ciência essencial na escola (junto com a psicologia, eu defendo ambas) para cada um entender a casa onde vive e passar a compreender que toda espécie viva contribui para o equilíbrio do funcionamento planetário para prover os recursos básicos para a nossa existência e que quaisquer alterações nos componentes do planeta irão criar uma reorganização no seu funcionamento que poderá ser prejudicial para a vida humana. A ecologia ainda tem em suas bases conceitos úteis inclusive para se aumentar a produtivade de alimentos a custos baixos (e talvez por isso não seja interessante!), ainda mais se aliada à sociologia do uso e da posse da terra (agora mais ainda sem interesse!).
E a pergunta é: por que que essas áreas do conhecimento são tão subvalorizadas e até desprezadas por governos e pelas próprias pessoas? Ao meu ver, o problema começa na escola, mas a escola é um produto de políticas governamentais, onde governantes são oriundos da sociedade que passou por aquela mesma escola. Ou seja, há um círculo vicioso difícil de quebrar e que fica mais sólido quando governos populistas – que falam e pensam o mesmo que o povo em geral – chegam ao poder e mantém ou acentuam aquelas chagas que limitam uma nova escola. A escola foi e ainda é um lugar de decrepitude para a maioria dos que passam por lá e os únicos que se dão “bem” são aqueles que por alguma natureza obscura se encaixam no formato do ensino e que, por outra natureza ainda mais obscura, conseguem ir inclusive além do que é ensinado e questionar aquilo. Os demais acabam por se cansar de ver tanta coisa escrita e sem sentido (como disse o próprio presidente Bolsonaro ao se referir aos livros com muito texto!). Esses, passam a odiar (posso usar essa palavra) o livro e logo em seguida serão aqueles que irão ir contra a ciência, contra qualquer conhecimento escrito e acreditar nas palavras de qualquer profeta fajuto que falar sobre os males sociais e trazer a panaceia para conjurar tais mazelas com o seu próprio conhecimento “de causa”.
E a arte? Onde fica a dita “cultura”, termo inapropriado, mas popularmente aceito para designar toda manifestação artística do indivíduo e de uma sociedade? Assistindo um documentário sobre o “Clube de Bagé”, que retrata a trajetória de um grupo de gaúchos sem instrução nenhuma começaram a desenhar e pintar e conseguiram um lugar entre os maiores artistas plásticos do país, reconhecidos mundialmente, vi que suas obras são exibidas em diferentes setores do Congresso Nacional e do Planalto (ao menos até 2017[!], ano do documentário), inclusive ano gabinete presidencial e de diversos deputados de direita. Curiosamente, muitos dos pintores eram comunistas! Creio que o papel da arte sempre teve esse ar de contrabalançar o poder político, talvez uma das razões de serem tachados sempre como vagabundos ou comunistas, num sentido pejorativo. Enfim, mas nesses lugares os entrevistados diziam que arte servia para expressar a alma daquele lugar e dos que lá estavam, inclusive até para intermediar e amenizar as diferenças políticas entre as partes quando estavam em uma sala. Percebam a profundidade do seu papel social. A arte não é só expressa em quadros, mas também na arquitetura, nos tradicionalismos, ou na composição de um jardim. Eu duvido que alguém, em algum momento, com as devidas condições, não tenha uma obra de arte em casa ou que não se sinta bem em um lugar, uma cidade, arquiteturalmente aconchegante. Ou, no mínimo, consiga dizer que o cinema, que o teatro, que a música, que a literatura ou qualquer outra não tenha um papel fundamental para a vida de um povo ou de si próprio.
O desconhecimento da relevância dessas outras tantas áreas do conhecimento é um produto da mesma forma que uma TV, que advém de diversos conhecimentos de diversas áreas da física e da química, de séculos de conhecimento somados e aperfeiçoados por pessoas que jamais imaginariam tal aplicação para sues experimentos, é vista passivamente como uma banal TV que se compra num mercado ao lado de um Baconzitos. Ao se observar uma TV, quem conseguiria dizer o quanto de conhecimento tem lá e quem foram as pessoas que contribuíram para aquilo ao longo da história humana? O desconhecer e a TV escondem dentro de uma caixa um mecanismo invisível e que por isso passa despercebido para tantos. O desconhecer leva, em algum momento, à ignorância de saber quando não se sabe por tanto se desconhecer. Assim, a pessoa que antes apenas desconhecia passa a ignorar o seu desconhecer e se achar apta a saber pelo que acha saber sobre aquilo que desconhece. Ela se torna ignorante, tanto de si como do mundo que a cerca e, sem saber que desconhece, passa a tomar decisões para si e para os demais a partir do seu poço de ignorância. E, é por essas e outras que todos esses conhecimentos que passam desconhecidos permanecem na ignorância de tantos, um entre os quais que um dia chegará a Presidência da República e que perpetuará a ignorância pôr a desconhecer.
Todo conhecimento é válido se ele for compreendido e aplicado. O que você deveria estar fazendo agora é se perguntando o porquê de tudo o que sabe então não ser aplicado. Essa é uma pergunta retórica, para você investigar e, nisso, eu vou assumir que, se você chegou até aqui nessa leitura, é porque é capaz de responder sozinho a essa pergunta ou pelo menos conjecturar algumas possíveis hipóteses para tal. O que eu sinto, lamentavelmente, é que aqueles que ignoram tudo isso, jamais chegarão até a este ponto final aqui.


sexta-feira, 28 de junho de 2019

A sociedade do futuro começa na tua mente


B.F. Skinner, famoso psicólogo comportamental, escreveu o romance – se assim dá para o chamar – Walden II, Uma Sociedade do Futuro, creio que motivado pelo célebre livro de Thoreau, onde descreve então a criação de uma comunidade alternativa ao modelo de desenvolvimento em voga. A partir da “engenharia do comportamento”, a comunidade se estrutura com novos formatos de ensino, trabalho e modos de vida. Difícil alguém ler e não se motivar com uma sociedade utópica como a qual. A ideia básica é que uma sociedade pode ser melhor conduzida a partir da ciência do comportamento, ou seja, ao se entender a psicologia humana e a partir disso desenvolver todo o modelo de desenvolvimento e envolvimento social para se atingir um estado de bem-estar único e jamais atingível dentro do nosso atual modelo de vida.
Eu poderia escrever muito mais sobre esse livro, mas nesse momento me atenho a uma passagem que, para mim, é central:

“(...) nós estimulamos nossa gente a olhar cada hábito e costume tendo em vista um possível aperfeiçoamento. Uma atitude constantemente experimental com relação a tudo – é isso que precisamos. Soluções para problemas de todo o tipo se seguem quase que milagrosamente”.

Percebem a profundidade dessa ideia? Ela quer dizer que, para acharmos as soluções para os problemas, primeiro temos que analisar todo o nosso comportamento, nisso nossos hábitos, nossa própria cultura (e daí eu sugeriria, se te interessares sobre esse pensamento, que estude a ideia de cultura para entenderes que cultura não é necessariamente algo bom!). Repensar nossas atitudes que se expressam a partir de comportamentos embutidos numa cultura geralmente invisível. Por que temos que nos vestir assim? Por que tenho que parecer sexy? Por que posto tantas fotos no Facebook/Instagram? Por que penso tão pouco acerca do todo, do mundo, do bem-estar das outras pessoas e tanto sobre o que eu quero ou não quero? Por que tenho que ter isso, agir assim, pensar dessa forma etc.? Por que comprar isso? De onde vem esse produto que estou a consumir? 

Sem um olhar crítico sobre tudo o que se faz (e esse fazer está estruturado dentro de um rol limitado de ações culturais), nós continuaremos sempre na mesma situação. Percebam que as mudanças sociais/culturais ocorrem sempre quando alguém pensa em algo diferente. Alguém, outra pessoa, não tu que estás preso, cego dentro de um sistema onde todos os outros estão e isso faz com que seja “normal” agir e pensar igual a todos. Aí, tem sempre alguém fora da caixinha, buscando novas formas de pensar, agir e fazer. São essas pessoas que levam a humanidade para a frente, enquanto que os demais (e tu!) ficam no lastro dessas mentes.

Soa, assim, que é preciso ser alguém muito especial para causar tais mudanças. Errado. Apenas é necessário desenvolver um senso crítico para analisar o que nos acontece, o que ocorre dentro das nossas cabeças. Uns aprendem meditação e isso é uma forte ferramenta. Outros conseguem desenvolver um senso natural de observação da mente, das ações e começa, assim, a surgir naturalmente questões de “Por que isso é assim?”. Um senso crítico assim permite que essas pessoas não comprem ideias que chegam a elas via Whatsapp, Facebook ou mesmo por textos aparentemente bem escritos. Questionariam inclusive esse texto com questões razoáveis e não tendenciosas, marcadas por uma tendência de defender o seu modo de vida, aquilo que acreditam apesar de todas as evidências contrárias.

Nisso, tu entenderás o conceito de “conservador” e “progressista”, embora a diferença, no fim das contas, pode ser sutil. O conservador é aquele que se deu bem dentro de um modo de vida e quer mantê-lo de todas as formas. Nossa política é praticamente toda conservadora, mesmo entre aqueles que se chamam de progressistas (por isso a sutileza na diferença quando se trata de políticos). O Brasil é uma país extremamente conservador nesse sentido e isso se observa, p.ex., quando se vê a disputa entre o agronegócio e o meio ambiente (falo disso por ser minha área de estudo). De tão conservador, o agronegócio, mesmo quando tecnifica suas atividades, ainda assim permanece conservador na ideologia por trás de como percebe o mundo ao redor. Isso cria um conflito desnecessário, dando força à forças retrógradas do desenvolvimento social e político e essa força elege uma pessoa tão atrasada nisso e conservadora ao extremo como Bolsonaro. De tão conservadores (para manter seu modo de vida inviolável a qualquer custo), combatem até a ciência que aponta a real necessidade de se manter ecossistemas saudáveis para o próprio agronegócio progredir (polinizadores, água, chuva, temperatura, controle de pragas etc.). Não vou me prolongar nesse parágrafo, já que não é esse tema o propósito desse texto. No entanto, a chave para os problemas está nesse tipo de comportamento.

Não pensar nossos comportamentos e atitudes leva, como diz Skinner, a não encontrar a solução para os problemas que enfrentamos e nisso ficamos dando voltas e voltas sempre nas mesmas questões. Quem ler Etienne de la Boétie, A Servidão Voluntária, vai perceber que os problemas descritos por ele na França de 1500 são os mesmos que ainda enfrentamos hoje no mundo. Sem mudanças de cabeça, como diz Daniel Quinn em A História de B, ou mesmo Einstein (numa frase atribuída a ele), não sairemos dessa roda. A solução de um problema não pode ser encontrada pela mesma cabeça que o criou, disse supostamente Einstein. Essa mudança de cabeça só é possível com a mudança de comportamentos/atitudes e essa só ocorrerá através do aperfeiçoamento dos nossos hábitos, como supõe Skinner.

Será que a gente consegue? É uma batalha individual, não adianta. No entanto, comportamentos mudam também ao se observar a mudança do outro e isso tem um potencial ainda maior para a mudança individual: estimular a mudança em cadeia. Assim, que tu sejas uma semente de mudança ao começar a parar por um instante todo dia, sentar, respirar profundamente umas três vezes, ouvir o som ao redor, acalmar a mente e então começar a perceber os pensamentos que te surgem e te empurram para certos comportamentos e, tomando consciência deles, perguntar-se: “De onde veio esse pensamento? Por que ele surgiu? Por que eu quero fazer isso, afinal? O que quero atingir agindo assim?”

Perguntas simples, mas difíceis de serem feitas pela necessidade desse momento de calmaria e percepção de nós mesmos ao invés do que queremos que os outros pensem sobre nós. Mudanças, mudanças que queremos, a sociedade que buscamos viver e contribuir para. Mudanças possíveis unicamente com a nossa mudança (lembram daquela frase clássica que é preciso arrumar o nosso quarto antes de tentar mudar o mundo?). Comece hoje, comece agora. Por que não? Se chegastes até aqui na leitura, tens o potencial para tanto ao ter a paciência para ler um texto com mais de 4 linhas e sem um meme! Comece, sente, respire, olhe ao redor e comece a observar a tua mente...apenas a tua.

quinta-feira, 22 de dezembro de 2016

Esquerda vs. Direita e o ignorante caminho do ser humano


A solução para a crise política do ser humano vai chegar quando ele abandonar os lados que defende. Digo o porquê. A esquerda vive ainda num estado estático de pensamento em que vê duas entidades sólidas, como que constituída por seres diferentes, populações diferentes, quase que genética e morfologicamente: a classe trabalhista e a classe detentora dos meios de produção. Parece que o romantismo invade o cenário social onde se perpetua aquela ideia do bem contra o mal, a luta do império contra os rebeldes. Porém, são seres da mesma espécie, mesma constituição genética e tudo o mais, mas apenas – e é o que os diferencia – pensam diferente. Acreditam em coisas diferentes, valores diferentes. Enquanto que a esquerda olha para teorias sociais do passado, a direita olha ingenuamente para o futuro. O ponto positivo nisso é que a esquerda lê, mas se prende ao que lê. Vejo isso claramente no discurso de pessoas que lutaram contra a ditadura brasileira, apegados às ideias maoístas, stalinistas e trostkyanas e que hoje admitem que estavam equivocados. O socialismo funciona bem na teoria e não na prática, basicamente porque o ser humano ainda não está preparado para um sistema social de cooperação mútua e por isso o capitalismo vai funcionando, capengamente, mas vai. A esquerda tem sua fraqueza incurável no seu próprio ideal que ignora a realidade social, onde haverá um lado perdedor (o do capital) que em nenhum momento cessará de tentar voltar ao poder. Não é de estranhar que a URSS, Cuba e China tenham fuzilado tantos capitalistas para tentar evitar a volta desses, impondo um regime de terror para manter o poder. Somente assim se mantém, pois de outra forma o capital voltará, sempre, porque a força do capital e a sociedade viciada no materialismo o fará voltar. Quando não, a falta de uma moral no próprio ideal do partido eleito o fará se render aos bens do capital ou ceder a ele, exemplo claro com o PT no Brasil, embora de uma forma menos explícita e ainda mantendo o Estado aparelhado (embora frágil, dando forças para a direita voltar – e voltou!).

Por outro lado, a direita com seu liberalismo acredita que a livre concorrência, sem um estado gerenciando a coisa, permite um melhor desenvolvimento econômico da sociedade. Ela acredita na ideia ingênua de que com o desenvolvimento econômico virá também um desenvolvimento social. Um ponto central aqui é a necessidade de se separar dois grupos dos defensores do liberalismo: o assalariado e o detentor do capital. Quem acredita que o liberalismo trará benefício social é assalariado defensor da ideia, mas não creio que essa seja uma crença dos detentores do capital, pois eles não estão nem aí para a questão do desenvolvimento social – quanto menos desenvolvido o social, melhor para se aproveitar dele como mão de obra e como consumidor. Uma prova disso é que as estatísticas relacionadas ao PIB e o bem-estar social há décadas desmentem isso, mas o neoliberal assalariado quer continuar a acreditar, porque do contrário seria admitir que a esquerda está certa. Nietzsche já tinha alertado que “por vezes as pessoas não querem ouvir a verdade porque não desejam que as suas ilusões sejam destruídas”. Isso vale para a esquerda também.


O calcanhar de Aquiles da direita é a premissa de que a moral do homem irá nortear a interação do econômico com o social através de leis. O problema é que, como estamos cheios de exemplos, não há moral no meio político-econômico. A moral é uma natureza ainda a ser desenvolvida no ser humano e esperar que ela surja como num passe de mágica é ingênuo ou até insano da parte do liberal. O problema é que no liberalismo econômico, o ser humano é apenas um número que gera capital e esse capital tende a se acumular na mão de poucos, principalmente em países em desenvolvimento onde a população em geral é ainda analfabeta em política e em economia, fácil de ser manipulada (é o caso do Brasil). É só olhar para ver isso acontecendo hoje (ou o liberal acredita num outro tempo ainda a vir? Aí ele seria ainda mais ingênuo do que já é).



No liberalismo econômico, tudo se torna fonte de capital, até os itens básicos como a água, saúde, saneamento etc. Tudo vira moeda e só terá acesso aos recursos quem tiver a moeda. Há nisso a falsa ideia da meritocracia, que diz que toda pessoa que se esforçar terá seu lugar ao sol. Haja lugares ao sol para isso então, numa sociedade de postos de trabalho em declínio. Nisso, aparece outra crença do liberal: a economia pode crescer e abarcar a todos. Para crescer, a economia precisa de recursos e consumo, recursos esse que ela mesmo já está extinguindo no meio ambiente e que tenderá a piorar com as mudanças climáticas que ela mesma também está conduzindo. Estoques pesqueiros sendo eliminados, terras agrícolas sendo exauridas, florestas tropicais em declínio e os oceanos sendo acidificados e esquentando (ambos cruciais para a regulação climática) e por aí afora. Escreveria um livro sobre isso, mas já existem muitos e é só preciso ler. Eis aqui um problema dos liberais: eles não leem sobre os problemas sociais e ambientais. Eles ignoram que a Economia é apenas uma subdisciplina da Ecologia. Eles vivem numa bolha da crença de que o dinheiro pode resolver qualquer coisa, o que na verdade só tente a piorar (quer exemplo mais clássico do que os EUA?). O liberal é extremamente materialista e enquanto pode comprar, tudo está bem. Quando o poder de compra cai, ele veste a camisa canarinho e vai para a Paulista protestar contra a esquerda, culpada da crise econômica (mas que sempre existiu e muito maior nos países liberais também – alguém vai negar isso?).



Ambos os lados, direita e esquerda, vivem numa bolha de ingenuidades e alimentam essas com suas crenças e falta de raciocínio crítico. Na verdade, e aqui é ponto central desse texto, é justamente essa falta de raciocínio lógico que limita o ser humano de atingir seu potencial máximo. O ser humano nasce desprovido da sabedoria, mas com o potencial de a obter. Contudo, basicamente por motivos sociais, ele não a desenvolve. Ele se contenta com o que aprende do meio, mas não processa logicamente aquilo que aprende. Ele apenas capta e se adapta a um meio, limitando todo o potencial de ir além daquele ponto como indivíduo e logo como ser social. Fogem à essa regra aqueles que pensaram, que escreveram livros e teorias, mesmo que equivocadamente, mas eles fugiram e pensaram. Contudo, o que vejo é um mar de pessoas apenas copiando e colando postagens desprovidas de pensamento original ou se atendo ao que foi escrito em outros tempos sem questionar o poder da autoridade erudita. Hoje, o modo de pensar da espécie humana, antes invisível, ficou explícito com o Facebook, que como disse antes, se limita ao aprender do meio sem pensar sobre: clico compartilhar, logo pensei.


A solução para o ser humano está em abandonar seus dogmas e ideologias, parar, sentar, respirar, refletir, olhar para os dois lados, entender o outro para então chegar num terceiro lado (e entender a multidimensionalidade da própria existência num universo multidimensional). O ser humano não vive uma crise – pelo simples fato de que crises acontecem de um momento para o outro num estado prévio de bonança. O problema do ser humano é uma de suas muitas naturezas: a sua própria ignorância. A pessoa que acha que está certa para acusar o outro deveria ter a capacidade de onisciência e nenhum ser humano até o momento a desenvolveu. Logo, seria sensato parar e considerar o que o outro está falando, balancear o próprio olhar e, nisso, quem sabe chegarem juntos a uma nova conclusão sobre o problema. Vejam que isso requer cooperação, união sem bandeiras hasteadas, pois a construção de uma sociedade justa requer cooperação e não luta de classes como prega a esquerda socialista/comunista e nem “que vença o mais capaz” como prega a direita neoliberal. O ser humano só será melhor quando não mais existirem bandeiras de futebol, de países, de partidos, pois isso significará o reconhecimento do ego em cada um, ego esse que simboliza a ignorância. Como a escala é enorme (sem bandeira de países?), poder-se-ia começar numa escala menor como a de partidos, isso porque esquerda e direita nunca poderão se sentar à mesma mesa, uma vez que ainda estarão imbuídas de seus ideais e crenças. Somente poderão se sentar à mesma mesa pessoas iguais e com os mesmos interesses. Será somente assim que o ser humano dará um passo em sua existência nesse universo infinito, esquecido de ser contemplado pela pessoa presa às teorias sociais e ao dinheiro. Sem isso, que nos acostumemos e convivamos com nossas próprias atrocidades em seus diferentes níveis um com o outro.



segunda-feira, 9 de novembro de 2015

Publicidade: uma atividade criminosa?

"A publicidade é uma atividade criminosa".
                                                                   -Eduardo Marinho 

Ao assistir documentários e ver pessoalmente o efeito devastador da publicidade de consumo sobre sociedades, crianças e o ambiente, a ideia expressa acima não parece estar equivocada. Usam-se artifícios psicológicos contra pessoas incapazes de se defender psicologicamente. O problema, talvez, é que muitos publicitários ignoram o efeito sistêmico do que realmente fazem e ainda dizem que "As pessoas compram porque querem comprar", como disse um publicitário no documentário 'Criança: A Alma do Negócio'.

Assista aos documentários:
The Economic of Happiness (A Economia da Felicidade)
Criança: A Alma do Negócio
Uma lição de ética sobre publicidade infantil - Prof. Clóvis de Barros Filho


segunda-feira, 26 de outubro de 2015

As correntes invisíveis da escravatura contemporânea


“A ditadura perfeita terá a aparência da democracia, uma prisão sem muros na qual os prisioneiros não sonharão sequer com a fuga. Um sistema de escravatura onde, graças ao consumo e ao divertimento, os escravos terão amor à sua escravidão.” 
---Aldous Huxley em Admirável Mundo Novo.

Depois de ler certos pensadores é difícil não se questionar sobre a forma como que a sociedade se estrutura e funciona, sobre a forma como se dá a busca pela profissão, pelo emprego, onde se eu ganho o outro perde a vaga. Há uma competição (in)visível, onde o tolo intelectual dirá que a natureza se estrutura da mesma forma, através da competição. Esses deveriam rever os novos postulados sobre a teoria darwiniana e ver que é muito mais através da cooperação que tais comunidades existem. Isso naturalmente levaria a um questionamento sobre o funcionamento de uma sociedade que se move apenas com o combustível do dinheiro, mas que poderia se mover sem ele - ver Utopia, de T. Morus. E isso é tido como normal, o funcionamento é aceito e questionado apenas por menos do que a minoria. O indivíduo ordinário mantém o sistema, dá corda nele. Corre para ocupar a vaga daquele que se demitiu por questões éticas e morais e com o dinheiro compra a roupa da Zara. Acha que por que vota, há democracia, quando o próprio sistema eleitoral não o é (se um candidato tem mais tempo de TV do que o outro, já aqui não há um sistema justo). Huxley está certo: somos escravos amando a escravidão, vivendo de angústias sem saber exatamente de onde vêm, embora esteja na nossa cara a causa.